Subscribe:

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Londres em chamas, jornalistas acesos: bastidores de uma cobertura 2.0


Não se fazem mais jornalistas como antigamente. Não desses com bloquinhos de anotação, caneta, um gravador e, no máximo, um celular 2G. Uma boa cobertura exige estar sempre ‘on’, ligado via smartphone e redes sociais no que está acontecendo a seu alcance e longe de si. Experimentei esse gostinho do jornalismo 2.0, já quase 3.0, enquanto cobria o quebra-quebra de Londres na semana passada. Como correspondente de última hora, também fiquei de olho em como os coleguinhas da imprensa britânica exploram as novas tecnologias na produção de notícias.
Eram duas da matina de terça (2 de agosto) quando recebi e-mail do chefão de São Paulo pedindo cobertura especial de Londres. Não tenho televisão em casa e, por isso, sintonizei o iPlayer da BBC (gratuito por aqui) para acompanhar as atualizações dos ataques na cidade. Escarafunchei os sites da Metropolitan Police e de Downing Street – gabinete do premiê – para saber dos números oficiais de presos, focos de tumulto no Reino Unido e agenda emergencial de David Cameron. Como todo órgão possui assessoria e está na rede, hoje é muito mais fácil encontrar informação precisa on-line. Ainda mais em casos excepcionais, como #londonriots.
Além de fazer um relato bem completo sobre cada ponto de incêndios e saques em Londres, o blog do 'The Guardian' listava o avatar dos repórteres que estavam no Twitter. Passei a seguir os 'correspondentes de crime': @PaulLewis, @sandralaville e @lizzy_davies. O Paul estava trabalhando de madrugada, tuitando a cada cinco minutos sobre a situação do local em que estava. Como no rádio, a cobertura via Twitter é recheada de intervalos fáticos e informações por se confirmar. Dizia Paul: “há relatos de incêndios em tal local” ou “situação mais calma por aqui, estou de saída para outra área”.
Salvei no celular os locais atingidos por vândalos àquela hora para seguir pra lá no início da manhã seguinte. Às 7 da manhã, já estava no trem rumo a Londres lendo o 'Daily Mail' via smartphone. O jornal acusava as redes sociais de serem as responsáveis pela onda de violência no Reino Unido. Determinismo tecnológico não cola comigo. Nem comigo nem com a galera do 'The Guardian', que respondeu à altura com um artigo sobre tecnologia e organização dos arruaceiros. O BlackBerry teria sido o canal preferido dos jovens rebeldes para planejar o quebra-quebra. Imediatamente, passo a seguir @UK_BlackBerry que, 1.0, não sabe bem como responder às questões de dezenas de tuiteiros e jornalistas sobre as mensagens que teriam sido trocadas pelos brigões por meio do Messenger do aparelho.
No meio do tiroteio tecnológico, encontro uma bandeira de paz e amor na tuitosfera. A campanha #riotcleanup mobilizava britânicos a ajudar comerciantes lesados pelos ataques. Pela hashtag, descobri que um dos grupos de voluntários estava em Hackney, um dos bairros mais afetados pelos crimes na noite anterior. O GPS me ajudou a chegar à notícia sem muito esforço. Fiquei pensando nas voltas que dei como repórter da 'CBN', atrás da fonte, do lugar exato da entrevista, até ficar tonto. Na época, cinco anos atrás, tudo que eu queria era uma bússola. Hoje, quase todos os jornalistas britânicos do mainstream têm.
Cruzei Londres do norte ao sul, entrevistando, acompanhando sites, blogs, tuítes, tuitando (claro!) e batendo textos pra cumprir a meta de tempo-real. E aí, o inevitável: a bateria do telefone móvel e do laptop acabou! Como tirar fotos da megainterdição em Clapham Junction? E da rua com todas as lojas depredadas? Se discordo da tese de determinismo tecnológico, não posso esquecer as sábias palavras do maior teórico da sociedade em rede, Manuel Castells: “tecnologia é sociedade”. Portanto, o exercício profissional de um jornalista 2.0 só pode ser compreendido levando-se em consideração seu uso da tecnologia.
Mas a gente dá um jeito. Dentre ruas vazias, quase sem viv’alma, encontrei um pub. Enquanto carregava o laptop, assistia ao telão da 'SkyNews' com as últimas notícias do dia. Com alguma bateria, volto ao local do crime, em Clapham Junction, e descubro que tem WiFi no meio da rua.... É Londres, afinal! Retomo a 'transmissão' para o Brasil e sigo conectado a todos os outros pontos da capital britânica via Twitter. Taí o futuro de nossa profissão: ser transmídia 24 horas! Haja fôlego!

Diego Iraheta é jornalista concluindo mestrado de Mídias Digitais na University of Sussex, na Inglaterra. Twitter: @diego_iraheta

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário