É quando chegamos a conclusão de que, enquanto seres humanos, já vimos e vivemos tudo aquilo que poderia estar ao nosso alcance que o mundo nos apresenta gratas surpresas e nos enchem de entusiasmo.
Só mesmo o Jornalismo para me apresentar histórias como a da Jornalista-Mestra-Doutora (ufa!) Joana Belarmino que, muito provavelmente, em breve me dará a honra de chama-la de mestra e sem dúvida confirmará a certeza de que eu não poderia ter feito escolha melhor.
Superação: Joana nasceu cega, mas se tornou jornalista, professora e doutora em Comunicação
Por Joana Alves (www.ampliarpb.com.br)
Não existem barreiras para quem busca cumprir metas. Joana Belarmino de Sousa é uma dessas pessoas para quem as limitações não foram obstáculo para atingir seus objetivos de vida. Ela nasceu cega, mas se tornou jornalista, professora do curso de Comunicação e Turismo da Universidade Federal da Paraíba e ainda possui doutorado em Comunicação e Semiótica pela Pontifica Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP); e é mestre em Ciências Sociais pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB/PB).
Em entrevista ao AmpliarPB, Joana Belarmino confessou suas dificuldades em virtude da deficiência visual, principalmente, quando se tornou repórter de um dos maiores veículos de comunicação da Paraíba, o jornal O Norte. Ela conta que exerceu a profissão num tempo em que uma pessoa cega teria muitas dificuldades para o exercício da profissão. “Trabalhávamos com máquina de escrever, e eu produzia textos que, embora todos pudessem ler, eu não podia”, explicou ao mesmo tempo em que disse ser uma situação engraçada.
Para alguns, isto seria uma situação complicada ou embaraçosa. Para Joana Belarmino, no entanto, a grande dificuldade que enfrentou no “batente” do jornalismo serviu como mais um aprendizado de vida. “Isso obrigou o meu cérebro a uma espécie de leitura antecipada do que eu ia escrevendo. Testemunhar coisas, acontecimentos jornalísticos sem a visão. Não é fácil.”, constatou, comentando que se valeu da sensibilidade e de sua veia poética, embora sabendo que no jornalismo diário essas coisas não cabem. Sim, ela ainda é poeta e cantora.
Joana Belarmino reconhece não ter chegado a se consolidar como repórter, mas garante que os nove anos de batente lhe rendeu um aprendizado, além de ter se sentido útil à sua cidade e à profissão. Mas seu desejo de mudança e de crescer como pessoa e como profissional – ato ao qual chama de inconformismo – levou-a a trocar a redação do jornal pela sala de aula. “A certeza de que eu havia cumprido um ciclo e que era preciso experimentar um outro lugar do campo da comunicação, um lugar onde eu pudesse estudar mais, crescer”, observou.
E ressaltou: “A academia é um lugar de muito trabalho, mas é ainda um lugar privilegiado. A gente estuda, se recicla, troca idéias com a galera jovem, não tem aquela compressão do dia a dia da redação, enfim, é um lugar onde a gente pode reavaliar práticas jornalísticas, teorias, convívios, pluralidades de pensamento”.
Para Joana, ser professora é um desafio estimulante, mas confessou ter alguns incômodos em relação à profissão. Um deles é não poder interagir com os alunos com o olhar que não possui. No entanto, deixa claro que não sofre com essa situação. Ela relatou que exercita uma forma muito própria de ser professora: “Procuro ficar ao lado deles, conhecer o que for possível de cada um. Às vezes passo como tarefa que cada um tenha um diário durante o curso. É como fotografar o interior de cada um. Decididamente, acho que aprendo mais com eles do que lhes ensino. Sou por natureza indisciplinada, a cada semestre mudo meus planos de curso, coloco trilhas sonoras nas disciplinas. Uma tentativa de seduzi-los para algo, um aprendizado, mas acho que sou eu que aprendo mais com eles”.
Ela disse ser difícil enumerar as dificuldades enfrentadas atualmente pelo deficiente visual, por acreditar que a experiência da cegueira é única para cada pessoa cega. Mas constatou ser a desigualdade social a maior dificuldade para o cego. “Os bens e serviços existem, mas o grupo que pode ter acesso a eles ainda é muito restrito. Então, posso dizer que, aliada à pobreza, a ‘invisibilidade institucional’ é o nosso maior problema. Invisibilidade, porque a política, as instituições, os governos, não pensam muito em nós, como cidadãos, e isso acaba sendo uma espécie de negação da pessoa cega”, esclareceu.
Os avanços tecnológicos contribuem para a acessibilidade dos deficiente visuais
Mesmo reconhecendo que cada pessoa cega tem o seu “cardápio de dificuldades” na sociedade atual, Joana Belarmino considerou que a era tecnológica qualificou a vida das pessoas cegas. “Ninguém imagina, mas há milhares de pessoas cegas nas redes sociais, em grandes empresas, em empregos alternativos”, disse ela, que também é uma internauta ativa: possui blog, twitter, etc.
A professora afirma que as novas tecnologias têm contribuído de forma surpreendente para a acessibilidade dos deficientes visuais. “São próteses ampliadoras dos nossos sentidos. Nossos olhos, nossos ouvidos, nossa percepção tátil. As tecnologias minimizam a limitação da cegueira, porque, com elas, fazemos coisas que nos estavam vedadas. Participamos, estamos incluídos. Com as tecnologias, não existe mais aquela página que eu não podia ler. É realmente um progresso sem precedentes”, destacou.
Ela considerou uma iniciativa fundamental a lei de autoria do deputado Branco Mendes que garante a instalação de mapas táteis e informações em braile em shoppings, prédios públicos, hospitais e outros estabelecimentos. Mas opinou que cabe à escola preparar a criança cega para o exercício de leitura de mapas, maquetes e outros processos que, muitas vezes, por se julgar que uma criança cega não vai compreender, ou seja, “a experiência lhe é negada dentro da própria sala de aula”. “De onde eu parto para compreender um mapa? O desenho em perspectiva, como uma pessoa cega pode compreender? São perguntas aparentemente tolas para uma pessoa que enxerga, para nós, precisam ser levadas a sério, logo na fase inicial do ensino”, observou.
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